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Senhores procuradores, vocês têm língua. Tomem a palavra!

Compartilhe essa notícia! | Data : terça-feira, setembro 27, 2011 | Series :

Emiliano Aquino - Professor da Universidade Estadual do Ceará (Uece) e pai de surdo

Ontem, Dia Nacional do Surdo, a Federação Nacional de Educação e Integração de Surdos (Feneis) apresentou, em vários Estados, denúncia ao Ministério Público Federal contra o Ministério da Educação. Em grave desrespeito à Convenção dos Direitos das Pessoas com Deficiência, que no Brasil tem status de Emenda Constitucional, a Língua Brasileira de Sinais vem sendo progressivamente eliminada das escolas como língua de instrução aos surdos brasileiros.

Essa eliminação tem ocorrido com o fechamento de classes e escolas bilíngues, que têm a Libras e o Português escrito como línguas de instrução, conforme o prevê o Decreto 5.626/2005 e o fundamenta a referida Convenção. De 2005 a 2008, fecharam cerca de 13.500 matrículas nessas classes e escolas. Consequência: entre 2006 e 2008, cerca de 15.200 surdos a menos no sistema educacional como um todo. Essa exclusão educacional, causada pela exclusão linguística, se torna ainda mais escandalosa porque este é um seguimento social de que apenas 70 mil crianças e jovens (13% dos que estão em idade escolar) estudam.

Essa é a consequência real de uma política abstrata de “inclusão”, que, na contramão de todo bom senso e das mais aceitas teorias psicológicas de educação, desconsidera a importância da língua na vida psíquica e intelectual. Crianças surdas são violentamente tiradas de ambientes linguísticos que lhes são social e academicamente favoráveis e inseridas arbitrariamente em ambientes linguísticos inóspitos.

A política de educação especial do MEC, quando muito, obriga crianças surdas que não adquiriram ainda a língua de sinais a receberem aulas traduzidas para Libras: de uma língua que ela não conhece a outra que ela ainda não entende.

Tradução não é instrução, tradutor não é professor, muito menos para crianças nos primeiros anos de sua vida escolar. Essa política volta a percorrer o tradicional caminho de fracasso escolar dos surdos. Isoladas em classes lusófonas, assim que podem, as crianças surdas as abandonam, sem Libras, sem Português, sem nada. Mais da metade o faz até o 5º ano do Fundamental.

Isso é mais do que a perda da escola. Como 95% das crianças surdas, filhos de pais ouvintes, dependem da escola bilíngue (que são para elas uma comunidade linguística natural) para a aquisição da Libras, grande parte delas permanece sem língua. E portanto: sem exercerem nenhum de seus direitos constitucionais fundamentais.

Senhores procuradores, vocês têm língua. Tomem a palavra!

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